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Entre centenas de estrangeiros que pisaram em solo cearense, sejam eles cristãos ou sem religião, nenhum é mais importante para o Movimento Pentecostal do que o missionário Gunnar
Adolf Vingren. Falar de sua permanência no Ceará, que teve duração de apenas 40 dias, parece ser simples. Todavia, o desejo constante em fazer a obra de Deus crescer lhe levou a envolver-se
incansavelmente quando esteve em terras alencarinas. Logo, é impossível que apresentemos aos leitores um registro completo, fiel, como eu gostaria que fosse.
A lembrança que ficou de sua passagem pelo Ceará foi o mover de Deus, vividos tanto pelos irmãos que residiam no Sítio Santana quanto na Fazenda Lagoinha, em São Francisco de Uruburetama. As duas congregações ouviram da voz do fundador da Assembleia de Deus no Brasil a genuína doutrina do Movimento Pentecostal. Curas divinas, profecias, batismos no Espírito Santo e salvação de almas eram constantemente testemunhados pelos pioneiros. A geração de Raimundo de Salles Gomes e de Vicente de Salles Bastos viveu de forma intensa esse pentecostes. Apesar do retorno de Vingren a Belém (PA) em janeiro de 1915, o fogo ainda continua aceso, mesmo estando próximo de comemorarmos o Centenário. Ele andou a pé, de animal de carga, dormiu de rede e acordava ouvindo sons de passarinhos. Bebeu água do Riacho Santana, comeu tapioca, degustou caldo de cana e comeu um feijãozinho cearense. Naqueles dias, não havia nada de luxo, tudo era igual para todos. O que diferenciava São Francisco de Uruburetama para Fortaleza, onde esteve por seis dias, era o bonde elétrico e as luzes do Centro da cidade, iluminada pela Ceará Gás, com seu gasômetro instalado ao lado da Santa Casa de Misericórdia e da Praça dos Mártires.
A continuação dessa história você encontra no meu livro “Gunnar Vingren no Ceará: 40 dias de avivamento pentecostal”, leia a história completa e veja por onde ele passou, o que aconteceu e como Deus acendeu a chama pentecostal no Ceará naqueles 40 dias da passagem deste grande missionário.
LEIA A OBRA ESCRITA POR CARLOS CASTRO
Sumário
Dedicatória …………………………………………………………………………………..7
Prefácio ………………………………………………………………………………………..9
Apresentação ………………………………………………………………………………11
Retrato da Fortaleza de 1914 ……………………………………………………….13
Gunnar Vingren: uma promessa de Deus para o Brasil ……………….15
A infância em Östra Husby e o aprendizado para o ministério ……17
As primeiras experiências missionárias ………………………………………19
Embarque no navio Clement ao Brasil ………………………………………..23
A obra em Belém antes da vinda ao Ceará ………………………………….25
Embarque com destino ao Ceará no Paquete Acre ………………………27
Paquete Acre singra o Atlântico em direção ao porto de Fortaleza ……29
Impressão sobre a Fortaleza de 1914 …………………………………………..31
Percurso da viagem até São Francisco de Uruburetama ………………33
Vingren é recebido pelo “Pai Salles” no Sítio Santana ………………….34
Ambiente reservado para os cultos era adornado com mesa
para púlpito e bancada ………………………………………………………………..36
Adolescente é batizada com o Espírito Santo na chegada de Vingren ….38
Pioneiro realiza primeiro batismo em águas no Sítio Santana ……..39
Três irmãos são batizados por Vingren no riacho Santana …………..40
Missionário celebra culto memorável de ano novo ……………………..41
Primeiro culto de 1915 em Sítio Santana é ministrado por Vingren …42
Pioneiro prova do leite mungido no curral ………………………………….43
Missionário celebra 1ª aula da EBD em 1915 no Sítio Santana …….44
Embate com o presbiteriano Valdivino Teixeira Bastos ……………….46
Dia de descanso é dedicado à leitura das cartas vindas de Belém ..48
Vicente de Salles Bastos recebe o missionário em sua casa ………….49
Vingren realiza visita à família de Francisco Teixeira Bastos ……….51
Vingren realiza último culto no Sítio Santana ……………………………..53
Primeiros cristãos pentecostais do Sítio Santana se despedem
do missionário ……………………………………………………………………………54
Vingren inicia o trajeto até a Fazenda Lagoinha ………………………….55
Maria de Nazareth profetiza sobre a seca de 1915 no Ceará ………..59
Vingren faz visita aos irmãos na Fazenda Lagoinha …………………….61
Despedida de São Francisco de Uruburetama ……………………………..62
Viajantes fazem o primeiro pernoite em São Miguel …………………..64
Viajantes fazem o segundo pernoite antes de chegarem
em Fortaleza ………………………………………………………………………………67
Missionário é hospedado pelo presbiteriano Cristóvão P. Guerra ..68
Reverendo presbiteriano recebe explicações sobre o batismo
com o Espírito Santo …………………………………………………………………..70
As últimas atividades ministeriais de Gunnar Vingren no Ceará …71
Pioneiro se despede de Fortaleza e embarca rumo a Belém …………73
Realizações ministeriais pelo Brasil e regresso a Suécia ……………….74
Bibliografia …………………………………………………………………………………77
Gunnar Vingren no Ceará: 40 dias de avivamento pentecostal
Dedicatória
Entre as famílias que compartilharam da presença do fundador do
Movimento Pentecostal no Brasil, missionário Gunnar Vingren,
recebido pelos itapajeenses como se filho fosse enquanto esteve aqui
no Ceará, sou conduzido a escolher uma prole e dedicar esta bela
história a um casal que gerou dez filhos e são participantes deste
mesmo Evangelho.
Aos 78 anos, Elsa de Castro, nascida em lar cristão no ano de
1935, fora transportada em um animal de carga num cesto de cipó,
dividindo com outro cesto que acomodava uma pedra de seu mesmo
peso, quando estava com seis meses de vida. Ela foi conduzida por
seus pais da cidade de Paracuru para São Luís do Curú, no Ceará,
onde foram pioneiros do Movimento Pentecostal na região.
Já Alfredo Gregório, seu esposo, era presbiteriano indepen
dente e morava em Pentecoste (CE). Os dois casaram-se em 1958.
Os membros da prole, “como plantas de oliveiras em volta de Sua
mesa”, cresceram e até hoje são abençoados. A primeira foi Amélia,
em homenagem a avó materna. Porém, o Senhor aprouve guardá-la
ainda na infância. Depois, nasceram Carlos, Cilas, Ageu e novamen
te uma menina que recebeu o nome de Amélia. Em seguida, foi a
vez de Alelia, Alfredo, Assuélia, Alaélia e o último, o Hassuero.
7
Gunnar Vingren no Ceará: 40 dias de avivamento pentecostal
Prefácio
Para William Shakespeare, a vida é uma simples sombra que pas
sa. Para Mahatma Gandhi, o homem progride quando faz uma
nova história. A. Comte dizia que é impossível se conhecer com
pletamente uma ciência enquanto não se souber da sua história.
É mais ou menos assim que devemos olhar a vida. Precisamos ter
uma percepção correta daquilo que representamos aqui na terra,
de uns para com os outros. Nesses dias em que a sociedade tem se
tornado líquida e errante, não valorizando seus paradigmas nem
sua história, faz-se necessário um “grito de alerta” a essa geração, a
fim de conduzi-la ao ponto de origem. Caso contrário, nos perdere
mos no decorrer dessa jornada, já que estamos vivendo os últimos
tempos civilizatórios.
“Gunnar Vingren no Ceará” vem para resgatar a história de
um avivamento que deveria ter continuado, não fosse a relapsi
dade e negligência de muitos, mas não de todos, já que chega a
tempo de revermos nossos conceitos teológicos e espirituais, prin
cipalmente nesses dias de angústia pela desvalorização da “santa
palavra de Deus”.
Se desejarmos realmente a propensão qualificada e quan
tificada da nossa história, bem como de nossa instituição, pre
cisamos nos despir dessa insensibilidade que tem obstaculado
e destruído nosso passado, libertando assim nosso presente e
projetando nosso futuro.
Alegro-me em pastorear milhares de ovelhas que convergiram
e convergirão suas vidas a Cristo, cem anos depois da chegada desse
“gigante do evangelho de Cristo, o Senhor”. Com certeza, vocês desco
briram como deva ser a vida de um verdadeiro sacerdote. Com certeza,
vocês se emocionarão com os detalhes e a simplicidade da vida desse
homem que renunciou tudo por amor ao evangelho.
9
Carlos Castro
Desejo que todo aquele que conhecer a história de nossa igre
ja, através de “Gunnar Vingren no Ceará”, valorize-a, respeite essa
instituição que tem produzido grandes feitos ao Reino de Deus e
com certeza ainda produzirá muito mais. Porém, não esqueça, você
é o agente que Deus escolheu para nessa hora, dá continuidade ao
avivamento trazido por aquele que foi o fundador do Movimento
Pentecostal no Brasil.
Deus Abençoe.
Pr. Jecer Goes
AD Canaã
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Gunnar Vingren no Ceará: 40 dias de avivamento pentecostal
Apresentação
Entre centenas de estrangeiros que pisaram em solo cearense,
sejam eles cristãos ou sem religião, nenhum é mais importan
te para o Movimento Pentecostal do que o missionário Gunnar
Adolf Vingren. Falar de sua permanência no Ceará, que teve du
ração de apenas 40 dias, parece ser simples. Todavia, o desejo
constante em fazer a obra de Deus crescer lhe levou a envolver-se
incansavelmente quando esteve em terras alencarinas. Logo, é
impossível que apresentemos aos leitores um registro completo,
fiel, como eu gostaria que fosse.
A lembrança que ficou de sua passagem pelo Ceará foi o
mover de Deus, vividos tanto pelos irmãos que residiam no Sítio
Santana quanto na Fazenda Lagoinha, em São Francisco de Uru
buretama. As duas congregações ouviram da voz do fundador da
Assembleia de Deus no Brasil a genuína doutrina do Movimento
Pentecostal. Curas divinas, profecias, batismos no Espírito Santo
e salvação de almas eram constantemente testemunhados pelos
pioneiros. A geração de Raimundo de Salles Gomes e de Vicente
de Salles Bastos viveu de forma intensa esse pentecostes. Apesar
do retorno de Vingren a Belém (PA) em janeiro de 1915, o fogo
ainda continua aceso, mesmo estando próximo de comemorar
mos o Centenário.
Ele andou a pé, de animal de carga, dormiu de rede e acor
dava ouvindo sons de passarinhos. Bebeu água do Riacho Santa
na, comeu tapioca, degustou caldo de cana e comeu um feijãozi
nho cearense. Naqueles dias, não havia nada de luxo, tudo era
igual para todos. O que diferenciava São Francisco de Urubureta
ma para Fortaleza, onde esteve por seis dias, era o bonde elétrico
e as luzes do Centro da cidade, iluminada pela Ceará Gás, com
seu gasômetro instalado ao lado da Santa Casa de Misericórdia e
da Praça dos Mártires.
11
Carlos Castro
Quer conhecer os caminhos por onde o missionário passou
e conhecer um pouco do que ele fez quando esteve no Ceará? Não
deixe de ler “Gunnar Vingren no Ceará – 40 dias de Avivamento
Pentecostal”. Que a graça do Senhor ilumine nossos corações e nos
faça verdadeiros “pioneiros” desse glorioso Movimento Pentecostal.
O autor
12
Gunnar Vingren no Ceará: 40 dias de avivamento pentecostal
Retrato da Fortaleza de 1914
O historiador Carlos Castro me pediu para que eu escrevesse al
gumas linhas sobre o livro “Gunnar Vingren no Ceará”, que
versa sobre a estada do religioso sueco em nosso estado para a im
plantação da hoje chamada Assembléia de Deus.
O ano em que ele chegou em Fortaleza, no paquete “Acre”,
foi em 1914, seguindo imediatamente para São Francisco de Urubu
retama (hoje Itapajé). Era uma época em que viajar era uma aven
tura. Os caminhos eram tortuosos, feitos apenas para passagem de
animais, os carros estavam ainda chegando na região e tinham que
atravessar rios e riachos.
Depois de cumprir o planejado em Itapajé ele se deslocou,
em 1915, para Fortaleza e aqui chegando prosseguiu no seu tra
balho religioso.
Fortaleza nessa época era uma cidade pacata, de clima ameno,
casas residenciais em toda parte, convivendo com as comerciais. Ti
nha chegado o cinema em 1908, mas era mudo. O centro da cidade
era a Praça do Ferreira, onde haviam cinco quiosques, o da Light
and Power & Co. para controle dos bondes e outros quatro um em
cada canto da praça, abrigando três cafés e um restaurante. Eram os
cafés do Comércio, Java e Elegante, além do Restaurante Iracema.
Haviam dois que tinham um segundo andar, o Café do Comércio e
o Café Elegante. Mais ou menos no centro da praça havia um gradil
com colunas em alvenaria que cercavam o Jardim Sete de Setembro,
mais ou menos em frente ao hoje Cine São Luiz. A praça era cerca
da de casas comerciais, como farmácias, mercearias, casas de miu
dezas, cinemas, restaurantes, lojas de artigos diversos, alfaiatarias,
estabelecimentos fotográficos, etc.
As ruas eram calçadas de pedras toscas e as calçadas não
eram muito uniformes, embora já houvesse a figura do meio-fio ou
fio de pedra.
13
Carlos Castro
As praças da cidade, além da do Ferreira, eram a Praça Mar
quez do Herval (hoje José de Alencar), a Praça Caio Prado (da Sé), a
General Tibúrcio, a Comendador Teodorico (da Lagoinha), a Castro
Carreira (da Estação), a Visconde de Pelotas (hoje Clóvis Bevilaqua), e
algumas em redor de igrejas como a do Carmo, Coração de Jesus, etc.
A cidade era iluminada à noite por combustores de gás hydro
geneo-carbonado, da Ceará Gás Company Ltd. que eram acendidos
por um trabalhador, todas as noites.
A praia ainda não havia sido descoberta pela população para a
prática do banho, era somente para a pesca e para as embarcações.
Os times de futebol estavam surgindo aos poucos; foi o ano em
que se iniciaram os times de futebol para disputa do campeonato.
Em 1914 havia na cidade a recém inaugurada Associação dos
Merceeiros; surgiu o Rio Branco Futebol Clube que logo mudou para
Ceará Sporting Clube; o Estado era governado pelo coronel Benja
min Liberato Barroso e o presidente da República era Wenceslau
Brás; a hoje Polícia Militar do Ceará chamava-se Regimento Militar
do Estado; e em 1915 inaugurava-se o Palacete Ceará na Praça do
Ferreira; inaugurou-se o Teatro São José; chega a Fortaleza o 26º BC
(hoje 23BC), instalando-se no quartel da Av. Alberto Nepomuceno
(hoje 10ªRm). Fortaleza tinha cerca de 72 a 73 mil habitantes. Tínha
mos já três faculdades.
1915 foi o ano de uma das maiores secas já sofrida pelo estado.
Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez)
14
Gunnar Vingren no Ceará: 40 dias de avivamento pentecostal
Gunnar Vingren: uma promessa de Deus para
o Brasil
Criado em lar cristão, o missionário Gunnar Adolf Vingren,
filho de Adolf Fredrik Eriksson e Albertina Kristina Eriksson
Vingren, nasceu em 08 de agosto de 1879 em Östra Husby, cidade
situada na região agrícola do sudeste de Östergötland County, na
Suécia. Anos mais tarde, o menino que crescia entre as belas flo
res dos jardins europeus ficaria encantado com a vitória-régia, flor
símbolo do Amazonas. Depois de ter sido um fiel companheiro
das plantas na juventude, quis o Senhor permitir que, em sua fase
adulta, ele viesse a ter contato com a notável flor, exatamente em
seu habitat natural.
Meses depois de seu desembarque no Pará, ocorrido no dia 19
de novembro de 1910, brotariam as primeiras flores que nasceriam
da semente do evangelho. O “laboratório”
de onde surgiriam esses preciosos frutos
foi a residência da pioneira Celina Martins
Albuquerque, localizada na Rua Siqueira
Mendes, nº 67, no bairro Vila Velha, em
Belém. Um deles foi Maria de Nazare
th, cearense natural de São Francisco
de Uruburetama, que juntamente
com a família, foi “expulsa” de
seu torrão natal no ano de 1889,
em consequência da terrível
seca que assolava o Ceará na
época. Desta “roseira”, seria
Missionário sueco
Gunnar Adolf Vingren.
15
Carlos Castro
exalado o bom cheiro de Cristo. Na intenção de perfumar os seus
patrícios com o odor exclusivo desta fragrância, ela motivou ao no
bre “cultivador de flores” a realizar uma visita aos cearenses, fato
que se concretizou entre dezembro de 1914 a janeiro de 1915.
No seio da família, o garoto Vingren foi instruído no culto
doméstico, ensino que moldou o seu caráter ainda na fase de cres
cimento. Aos nove anos, seu coração juvenil sentiu a chamada para
a obra. Ainda no tempo de sua infância, não era raridade os pais
presenciarem o menino em comunhão com outras crianças em mini–cultos, onde ele já se apresentava como se fosse um pastor. Tal
aprendizado contribuiria decisivamente para a sua vida ministerial
no futuro, sobretudo, quando esteve por um período de 21 anos na
liderança da Missão da Fé Apostólica no Brasil, onde foi fundador
junto com o compatriota Daniel Berg, no dia 18 de junho de 1911
em Belém. Em 1918, a denominação passou a se chamar Assembleia
de Deus.
Pais de Gunnar Vingren: Albertina
Kristina Eriksson Vingren e Adolf
Fredrik Eriksson.
16
Gunnar Vingren no Ceará: 40 dias de avivamento pentecostal
A infância em Östra Husby e o aprendizado
para o ministério
A interiorana Östra Husby abrigava um pequeno templo da Igre
ja Batista na metade do século XIX. Foi nesse ambiente cristão
que o missionário cresceu como um aluno da Escola Bíblica Domi
nical (EBD). Anos mais tarde, ele veio a substituir o próprio pai
que era professor.
Certa vez, Vingren testemunhou em uma de suas pregações
que sentiu a chamada para a obra de Deus já aos nove anos, mas
viveu momentos críticos entre os 12 e 17 anos, quando se afastou do
convívio da igreja. Foram cinco anos vivendo uma vida de filho pró
digo. De tudo o que fez, o maior arrependimento foi o desgosto que
provocou aos pais. O gozo indizível de sua conversão ao Evangelho,
como ele mesmo ressaltou, só aconteceria aos 17 anos, durante um
culto de vigília ocorrido no final de 1896. A partir daquele momento,
ele retornou em definitivo ao lar paternal e, no ano seguinte, foi ba
tizado em águas na Igreja Batista de Wraka, em Smaland, na Suécia.
Ao centro, Gunnar Vingren em família com a idade aproximada
de nove anos.
17
Carlos Castro
O amor por missões se revelou em 14 de julho de 1897, após a
leitura de um artigo de uma revista que relatava sofrimentos e per
seguições sobre tribos nativas na África. O assunto levaria o pioneiro
às lagrimas e a tomar a decisão que mudaria completamente o rumo
de sua vida. “Subi para o meu quarto e ali prometi a Deus pertencer–lhe e pôr-me à sua disposição, para honra e glória de seu nome.
Orei também insistentemente para que Ele me ajudasse a cumprir
esta promessa”1, assim deixou escrito em seu diário.
Em outubro de 1898, o missionário deixou a direção da Escola
Dominical para participar de uma escola bíblica em Götabro, na pro
víncia de Närke, em um órgão ligado a uma federação evangélica.
Cerca de 55 crentes, entre homens e mulheres, participaram das
reuniões que duraram em torno de 30 dias, com temas voltados
para missões. Ao final do curso, aproximadamente 15 deles foram
enviados como evangelistas e saíram em dupla, apenas com o valor
da passagem para o local pretendido.
O próprio Vingren deixou registrada a impressão que a escola
bíblica lhe causou:
Nunca mais na minha vida recebi uma instrução bíblica tão
profunda como aquela. Pastor Kihlstedt nos quebrantava
completamente com a Palavra de Deus. Ele nos tirava tudo,
tudo, até que ficássemos inteiramente aniquilados como pó
diante dos pés do Senhor. Depois vinha o irmão Emílio
Gustavsson com o óleo de Gileade, e sarava as feridas da
alma, alimentando nossos corações famintos com o melhor
trigo dos celeiros de Deus. Oh! Que tempo aquele! Fez-me
bem pelo resto de toda a minha vida.2
1VINGREN, 2004, p. 20.
2VINGREN, 2004, p. 20-21.
18
Gunnar Vingren no Ceará: 40 dias de avivamento pentecostal
As primeiras experiências missionárias
As primeiras localidades evangelizadas pelo jardineiro, agora mis
sionário, foram as províncias de Skane e Västergötland, na Sué
cia. O bom conhecimento da região e a ousadia que lhe era peculiar
permitiram que, em um curto espaço de tempo, realizasse inúmeros
cultos nas casas. O trabalho só teve pausa em Tidaholm, enquanto
se recuperava da Parotidite (papeira), uma infecção viral contagiosa
que provoca dilatação dolorosa das glândulas salivares.
Enquanto se recuperava da doença, ele sonhou em uma noite
que havia dormido no Senhor e que seus pais haviam participado do
cortejo. O relato serviu para mostrar a intensidade do estado febril
que o sueco estava no momento, onde chegou ao ponto de ter um
pesadelo. Entretanto, em um sábado à noite Vingren foi curado,
após receber a visita de irmãos que rogaram ao Senhor pelo restabe
lecimento de sua saúde.
Depois disto, evangelizou em uma aldeia de pescadores situa
da em Rönneholm. Quando de sua passagem pela cidade, escreveu
em seu diário que o céu havia se aberto sobre todos, enquanto can
tava o hino intitulado “Jesus, faz-me sereno e satisfeito”. Em segui
da, visitou Svedala, e de lá retornou a Skane.
A experiência no campo missionário foi gratificante. No en
tanto, o jovem precisava de recursos financeiros para se manter e
não teve outra saída a não ser ir em busca de trabalho. Seu primeiro
emprego foi em serviços de jardinagem, mais precisamente na poda
de plantas e roseiras. O ofício em que desenvolveu permitiu que ele
ajudasse a família por determinado tempo, tendo finalizado a ativi
dade cuidando dos belos jardins do palácio real de Drottningholm.
Em 1890, alistou-se para o serviço militar em Söderköping.
Entre 1600 soldados, 20 eram cristãos, incluindo Vingren, o fun
dador do movimento pentecostal do Brasil. Foram 68 dias entre
a apresentação e a desistência, servidos em Malmslätt. Diante da
19
Carlos Castro
decisão tomada, concluímos que o desejo do coração do recruta
estava mesmo era voltado para ser um soldado de Jesus e defender
não as fronteiras da Suécia mais conduzir milhares e milhares de
brasileiros a um encontro com o grande General dos Generais. Na
curta passa
gem pelo quartel, ainda gozou do privilégio de pregar
no auditório da capela da corporação para centenas de soldados.
De volta à casa paterna, o missionário tornou a desenvolver
atividades relacionadas à jardinagem. No período noturno, passou
a cooperar na igreja realizando cultos evangelísticos, nos arredores
da comunidade onde residia. Aos 24 anos, foi contagiado por um
impulso vivido por muitos compatriotas, que na época decidiram
buscar melhor condição de vida nos Estados Unidos. Em 30 de ou
tubro de 1903, embarcou com destino a América do Norte.
No porto, situado na cidade de Gotemburgo, se despediu da
família e de parte da igreja antes de zarpar no vapor M/S Romeo.
Chegava o momento do filho ilustre da família Vingren, carrega
do de sonhos, seguir o seu novo destino. O primeiro desembarque
aconteceu na cidade de Hull, na Inglaterra. De trem, seguiu até Li
verpool, de onde embarcou em outro navio com destino a Boston,
em Massachusetts, nos Estados Unidos. De lá, prosseguiu de trem
até Kansas City, onde desembarcou em 19 de novembro de 1903,
após 20 dias de viagem.
A casa do tio Carl Vingren, localizada no Kansas City, foi o
seu primeiro endereço. Na cidade, passou a trabalhar numa fábrica
em Greenhouse, onde ocupou o ofício de foguista, que era a pessoa
encarregada de manter em funcionamento a máquina a vapor. Depois
de pouco tempo, passou a trabalhar como porteiro em uma casa co
mercial. Chegado o inverno, começou a atuar em serviços de jardina
gem. Nos últimos dias de fevereiro de 1904, o missionário viajou a St.
Louis, onde conseguiu emprego no Jardim Botânico. Aos domingos,
ele assistia o culto em uma igreja sueca que existia na cidade.
No final de setembro de 1904, se deslocou para Chicago e ini
ciou seus estudos no seminário teológico sueco dos batistas, onde
20
Gunnar Vingren no Ceará: 40 dias de avivamento pentecostal
concluiu depois de quatro anos. O primeiro estágio de Vingren
como seminarista aconteceu de junho a dezembro de 1904, nas con
gregações da Igreja Batista de Chicago, em Michigan. Em seguida,
ministrou em Sycamore e Blue Island, no Illinois, até alcançar o
pastoreio em Mountain, em Michigan.
A sua diplomação no curso teológico aconteceu em maio de
- Em junho, passou a servir na Igreja Batista de Menominee, em
Michigan, onde pastoreou até fevereiro de 1910. Três meses antes,
em novembro de 1909, com a permissão da igreja, ele havia visita
do a Primeira Igreja Batista de Chicago com o objetivo de buscar o
batismo com o Espírito Santo. Ali, recebeu o selo da promessa no
quinto dia de conferência e passou a conhecer o compatriota Daniel
Berg, com quem viajaria ao Brasil em novembro de 1910. Naquele
momento, nasceu a chama pentecostal em sua vida, como deixou
escrito em seu diário:
Quando recebi o Espírito Santo, falei línguas, justamente
como está escrito que aconteceu com os discípulos no dia
de Pentecoste, em Atos 2. É impossível descrever a alegria
que encheu o meu coração. Eternamente o louvarei, pois
Ele me batizou com o seu Espírito Santo e com fogo.3
Ao voltar a Menominee, teve as garantias da Convenção Ba
tista do Norte para ir ao campo missionário. Porém, buscou em
Deus uma resposta e recebeu um “não”, tendo feito, em seguida,
a sua desistência por escrito. O fato de ter negado o convite para
fazer missões transculturais na Índia naquele momento e o novo
ensino sobre o batismo no Espírito Santo trouxe um rumo diferente
ao recém-obreiro, pois a igreja passou a viver em um clima dividi
do, entre os que concordavam com aquela nova experiência cristã e
os que não eram favoráveis. A sua noiva, por exemplo, se colocou
contrária e logo rompeu com o noivado. Ao receber a carta da pre
tendida, respondeu: “Seja feita a vontade do Senhor”4.
3 VINGREN, 2004, p. 25.
4 VINGREN, 2004, p. 25.
21
Carlos Castro
A “estranha” doutrina de que Jesus batizava com o Espírito
Santo e com fogo, para os irmãos batistas, levou Vingren a ser con
vidado a deixar a igreja. Em fevereiro de 1910, o querido pastor,
pelo menos para um grupo restrito de irmãos daquela comunidade
cristã, participou do culto que marcaria a sua despedida. A notícia
correu depressa. Logo em seguida, a Igreja Batista em South Bend,
na Indiana, convidou o “batista batizado com o Espírito Santo” para
ministrar algumas conferências sobre o falar em novas línguas. Eles
estavam interessados em ouvir as exposições bíblicas pregadas pelo
sueco. Para a surpresa do mensageiro, toda a igreja creu e o gozo na
presença do Senhor foi indescritível.
No sétimo dia da série de conferências, 10 irmãos já haviam
recebido o selo da promessa. Aquela ação divina trazia um gozo
inefável ao coração de Vingren, pois contemplava que Deus estava
transformando em um verdadeiro pentecostes a igreja de seus pais,
denominada Batista. O missionário era um exímio doutrinador da
mensagem das Boas Novas: “Cristo salva, batiza com o Espírito San
to, cura e leva para o céu”. Ele não deixou de ser um pastor batista
até o momento em que foi desligado da igreja, tanto nos EUA quan
to em Belém, no Pará, quando chegou ao Brasil. A sua intenção não
era criar outra denominação.
Sobre a transformação vivida pela Igreja Batista em South
Bend, ele assim relatou em sua agenda: “No total, foram quase vin
te pessoas batizadas com o Espírito Santo naquele verão. Glória a
Jesus! Assim Deus transformou a igreja batista em South Bend, In
diana, em uma igreja pentecostal”5